BANGALÔ DE
PAU A PIQUE
Nas minhas idas e
vindas à grande cidade de São Paulo, fico sempre admirando os majestosos prédios, um ao lado do outro que se
multiplicam todo dia , formando uma verdadeira “Selva de Pedra”, uma cidade
vertical, que aos poucos vai escondendo a sua história . Cada vez mais , vamos
nos distanciando do centro, onde os prédios antigos, os palacetes, as ruas
antes famosas ,vão sendo engolidas pela modernidade.
Acho admirável o
desenvolvimento, a arquitetura moderna, cada vez mais inovadora, uma construção
nova a cada 100 metros e me detenho diante do progresso e o do grande poder
criativo do homem, voltando no tempo e lembrando de coisas que muito pouca
gente que hoje vive por aqui, teve oportunidade de ver e viver.
Nesses momentos , sinto-me quase pre histórica, diante de lembranças que me
levam aquém da civilização atual.
Vejo-me na praia, na minha querida e distante Barra de Sirinhaem, acompanhando a construção altamente empírica e primitiva de uma casa de
pau a pique. Como isso me encantava ! Eu
era muito menina ainda e adorava tudo
daquele lugarzinho de sonho.
Perto da nossa
casinha de praia , que ficava no meio dos pescadores, meus amigos queridos que
me faziam participar ativamente das suas vidas e costumes, sempre havia um, construindo sua casa . Era feito um mutirão e todos os amigos se juntavam para
a construção. Primeiro , eles preparavam o terreno e logo apareciam os paus e
barro, material utilizado para edificar
mais uma casa de pau a
pique. Com a maior eficiência , eles faziam a armação de madeiras que se
entrelaçavam e a casa era projetada com suas divisões mais ou menos iguais. O
barro era muito bem amassado com os pés , numa dança quase erótica . Depois , com as mãos os
construtores iam enchendo os quadrados de madeira e as paredes iam se formando. Tudo era feito
no maior capricho e as paredes, como se de alvenaria fossem, eram alisadas com
pás de pedreiro e depois caiadas. O piso , era de chão batido, lisinho como de
cimento. Em poucos dias a obra estava pronta para a cobertura que na maioria
das vezes , era de palha de coqueiro. As palhas eram tiradas e selecionadas. As
folhas eram quebradas no tronco da palha e ficavam todas viradas para um mesmo
lado. Depois eram colocadas uma sobre a outra como se fosse um telhado e
amarradas uma a uma , ficando firmes e bem fechadas. Que maravilha !!!
No corpo da casa , ficavam os quartos , uma varanda , uma sala e uma
cozinha. Na cozinha era construído, também de barro um fogão a lenha e um
balcão , onde se colocava uma bacia para lavar a louça. Não havia pia porque
não havia água encanada. Também não precisava de fiação porque não tinha luz
elétrica. O banheiro ficava fora da casa
e era um cercadinho de palha com um buraco no chão onde se faziam as
necessidades. O banho era de bacia ou
de canequinha. Eu, particularmente , achava tudo encantador e hoje fico
pensando como era fácil viver naquele lugar.
Atrás da casa, sempre
tinha uma cacimba, sem muita engenharia também. Cavou , achou água, pronto
: o poço estava feito e a água era retirada com uma lata presa em uma corda. Lembro do cheiro da
água: "cheiro de lama" . Hoje sei que aquela água de poço tão raso e
próximo de banheiro natural, devia ser altamente contaminada e imprópria para
beber . A água potável, vinha de uma cacimba mais profunda. Pronto ! Logo uma família ali se
instalava e era só
felicidade. Os móveis constavam de camas feitas de pau , tipo jirau com uma esteira em cima ou quando muito um colchão de capim.. Umas
cadeiras eram enfileiradas na sala e na cozinha tinha uma mesa para as
refeições. Estas , geralmente consistiam de peixe e um pirão feito com o seu
molho. De vez em quando tinha um feijão e um pouco de carne de charque , de
tartaruga ou galinha. O café era comprado em grão, torrado no fogão e socado no
pilão de madeira , no fundo da casa.
Em volta do BANGALÔ, geralmente se fazia uma cerquinha,
onde galinhas , patos e até perus eram criados, à maneira caipira. Tudo de bom
! Os bichinhos saiam do cercado e
circulavam pela redondeza, sempre voltando ao seu quintal . Os porcos eram criados soltos e tudo era harmonia.
Geralmente, no
quintal tinha um cajueiro, uma mangueira , um coqueiro e muito pé de flor. O terreiro era muito varrido e latas com plantas completavam o
arrumadinho. Era lindo de ver !!!
Eu, particularmente ,
adorava tudo isso e costumava andar pelos matos, que na praia são rasteiros, em
busca ,principalmente de araçás que
davam em todo lugar. Minhas andanças eram descalça e sempre ganhava aquela
coceirinha gostosa do bicho de pé. Ah !
Quanta saudade dessa experiência de vida ! Viver tudo isso , me fez ser uma pessoa mais
ligada à natureza, à vida simples de pessoas simples, com sonhos simplórios e
pequenas ambições. Aprendi a respeitar a vida como ela é e entender o viver de
cada um. Quando encontro pessoas que tem
esse tipo de vida, consigo chegar nelas e conversar de igual pra igual, porque
sou igual a elas .
Seria hipocrisia da
minha parte , dizer que gostaria de viver assim hoje. Claro que dependo do
conforto da modernidade, mas com certeza o meu espírito se adaptaria a qualquer situação, até porque
tenho uma vida no meio do mato e sou feliz com essa condição. Ao olhar
os imensos prédios de Sâo Paulo,
sinto que não gostaria de morar trepada num deles, tendo que me submeter a um
espaço limitado, elevador e regras de condomínio. Sou mesmo um ser meio primitivo nesse aspecto. Gosto de
espaço, de silencio, de árvores à minha volta, de passarinhos cantando, de
flores sem “ pedigree “ colorindo os campos.
Meu “BANGALÔ” no meio
do mato , não é de pau a
pique , tem estrutura diferente, mas não
fica muito atrás do que vi e vivi na minha
infância privilegiada. Falta a praia,
faltam os coqueiros, falta o sol e o céu deslumbrante da minha terra, mas não
deixa de ser um “ pedacinho de céu “.
Graça,julho/2012
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