sexta-feira, 6 de julho de 2012


                          BANGALÔ   DE  PAU A  PIQUE

                          Nas minhas idas e vindas à grande cidade de São Paulo, fico sempre admirando os majestosos  prédios, um ao lado do outro que se multiplicam todo dia , formando uma verdadeira “Selva de Pedra”, uma cidade vertical, que aos poucos vai escondendo a sua história . Cada vez mais , vamos nos distanciando do centro, onde os prédios antigos, os palacetes, as ruas antes famosas ,vão sendo engolidas pela modernidade.
                          Acho admirável o desenvolvimento, a arquitetura moderna, cada vez mais inovadora, uma construção nova a cada 100 metros e me detenho diante do progresso e o do grande poder criativo do homem, voltando no tempo e lembrando de coisas que muito pouca gente que hoje vive por aqui, teve oportunidade de ver e viver.
                           Nesses  momentos , sinto-me quase  pre histórica, diante de lembranças que me levam aquém da civilização atual.  Vejo-me na praia, na  minha  querida  e distante Barra de Sirinhaem,  acompanhando a construção  altamente empírica e primitiva de uma casa de pau a pique. Como isso me  encantava ! Eu era muito menina ainda e  adorava tudo daquele lugarzinho de sonho.
                           Perto da nossa casinha de praia , que ficava no meio dos pescadores, meus amigos queridos que me faziam participar ativamente das suas vidas e costumes, sempre havia um, construindo sua casa . Era feito um mutirão e todos os amigos se juntavam para a construção. Primeiro , eles preparavam o terreno e logo apareciam os paus e barro, material utilizado  para  edificar  mais  uma casa  de pau  a  pique. Com a maior eficiência , eles faziam a armação de madeiras que se entrelaçavam e a casa era projetada com suas divisões mais ou menos iguais. O barro era muito bem amassado com os pés , numa dança quase erótica .  Depois , com as mãos  os  construtores iam enchendo os quadrados de madeira  e as paredes iam se formando. Tudo era feito no maior capricho e as paredes, como se de alvenaria fossem, eram alisadas com pás de pedreiro e depois caiadas. O piso , era de chão batido, lisinho como de cimento. Em poucos dias a obra estava pronta para a cobertura que na maioria das vezes , era de palha de coqueiro. As palhas eram tiradas e selecionadas. As folhas eram quebradas no tronco da palha e ficavam todas viradas para um mesmo lado. Depois eram colocadas uma sobre a outra como se fosse um telhado e amarradas uma a uma , ficando firmes e bem fechadas. Que maravilha !!!                                                                                                           No corpo da casa , ficavam os quartos , uma varanda , uma sala e uma cozinha. Na cozinha era construído, também de barro um fogão a lenha e um balcão , onde se colocava uma bacia para lavar a louça. Não havia pia porque não havia água encanada. Também não precisava de fiação porque não tinha luz elétrica.  O banheiro ficava fora da casa e era um cercadinho de palha com um buraco no chão onde se faziam as necessidades.   O banho era de bacia ou de canequinha. Eu, particularmente , achava tudo encantador e hoje fico pensando como era fácil viver naquele lugar.
                          Atrás da casa, sempre tinha uma cacimba, sem  muita  engenharia também. Cavou , achou água, pronto : o poço estava feito e a água era retirada com uma lata  presa em uma corda. Lembro do cheiro da água:  "cheiro de lama" .  Hoje sei que aquela água de poço tão raso e próximo de banheiro natural, devia ser altamente contaminada e imprópria para beber . A água potável, vinha de uma cacimba mais profunda. Pronto !  Logo uma família  ali  se instalava  e  era  só felicidade.   Os móveis  constavam de camas feitas de pau , tipo jirau  com uma esteira em cima  ou quando muito um colchão de capim.. Umas cadeiras eram enfileiradas na sala e na cozinha tinha uma mesa para as refeições. Estas , geralmente consistiam de peixe e um pirão feito com o seu molho. De vez em quando tinha um feijão e um pouco de carne de charque , de tartaruga ou galinha. O café era comprado em grão, torrado no fogão e socado no pilão de madeira , no fundo da casa.
                          Em volta do  BANGALÔ, geralmente se fazia uma cerquinha, onde galinhas , patos e até perus eram criados, à maneira caipira. Tudo de bom !  Os bichinhos saiam do cercado e circulavam pela redondeza, sempre voltando ao seu quintal .  Os porcos eram criados soltos e tudo era harmonia.
                         Geralmente, no quintal tinha um cajueiro, uma mangueira , um coqueiro e muito pé de flor.  O terreiro era muito varrido e  latas com plantas completavam o arrumadinho.  Era lindo de ver !!!
                         Eu, particularmente , adorava tudo isso e costumava andar pelos matos, que na praia são rasteiros, em busca ,principalmente de araçás  que davam em todo lugar. Minhas andanças eram descalça e sempre ganhava aquela coceirinha gostosa do bicho de pé. Ah !  Quanta  saudade dessa  experiência de vida !   Viver tudo isso , me fez ser uma pessoa mais ligada à natureza, à vida simples de pessoas simples, com sonhos simplórios e pequenas ambições. Aprendi a respeitar a vida como ela é e entender o viver de cada um.  Quando encontro pessoas que tem esse tipo de vida, consigo chegar nelas e conversar de igual pra igual, porque sou igual a elas .
                        Seria hipocrisia da minha parte , dizer que gostaria de viver assim hoje. Claro que dependo do conforto da modernidade, mas com certeza o meu espírito  se adaptaria a qualquer situação, até porque tenho uma vida no meio do mato e sou feliz com essa condição.  Ao olhar  os  imensos prédios de Sâo Paulo, sinto que não gostaria de morar trepada num deles, tendo que me submeter a um espaço limitado, elevador e regras de condomínio.  Sou mesmo um ser  meio primitivo nesse aspecto. Gosto de espaço, de silencio, de árvores à minha volta, de passarinhos cantando, de flores  sem “ pedigree “  colorindo os campos.
                         Meu “BANGALÔ” no meio do mato , não é  de   pau a pique , tem estrutura diferente, mas  não fica muito atrás  do que vi e vivi na minha infância privilegiada.  Falta a praia, faltam os coqueiros, falta o sol e o céu deslumbrante da minha terra, mas não deixa de ser  um  “ pedacinho de céu “.

Graça,julho/2012                                    

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