segunda-feira, 12 de março de 2012

A Casinha Do Morro



                     A estrada esburacada e poeirenta no verão e , no inverno,  cheia de barro e quase intransitável, era o acesso principal, da Usina até Recife.  Fazíamos  o percurso  todas as vezes que precisávamos e a viagem demorava normalmente  umas  três horas  de  ônibus, quando não havia nenhum problema. 
                      Eu adorava a viagem, adorava a paisagem  e marcava os pontos do trajeto, ora com uma árvore, ora com uma pedra, às vezes pintada de branco , ou ainda  com uma casinha na encosta do morro, que me fazia sonhar. É , eu também sonhei com um amor e uma casinha como aquela, pintada de branco, com uma porta e uma janela azuis, no meio de um quintal bem varridinho e rodeada de plantas, de preferência com flores. Era tudo que eu queria !                         Nas minhas idas e vindas por aquela estradinha, eu me deixava levar pelo sonho e a vida me parecia tão simples e tão fácil...          Na minha cabecinha de quase adolescente, quem vivia naquela  casinha , tinha tudo prá ser feliz !  Nunca me passava pela cabeça que viver fosse uma coisa tão complexa. Nunca pensei  nas dificuldades  do isolamento daquelas pessoas, longe de tudo, privadas de qualquer conforto. Nunca me ocorreu que eu  pudesse  não ser feliz  tendo uma vida igual.
                     Numa dessas viagens, eu estava indo prá Recife com Lia , que me levaria para o colégio interno, pois era a volta das férias de junho/ julho.  A estrada era um mar de barro e os buracos , vez por outra surpreendiam o motorista, que no meu entender era um ás do volante.  Mesmo com toda sua perícia, não foi possível evitar um transtorno que nos deixou na estrada por um bom tempo. A viagem de três horas virou uma longa viagem de sete horas. Na estrada não tinha nada que pudesse nos socorrer nas nossas necessidades básicas. Esperamos pacientemente que o percurso fosse retomado, até que não deu mais prá segurar a vontade de  ir ao banheiro. Alguns passageiros, se aliviaram ali no mato mesmo, mas eu , uma mocinha recatada, não tive alternativa .  Tive que optar por um banheiro e empreendi  a caminhada morro acima com destino à casinha branca dos meus sonhos. E lá fui eu , lépida e formosa pedir socorro  à dona da casa , que muito solícita me indicou um cômodo . Entrei lá e de cara, vi que não se tratava de um banheiro e fiquei sem saber o que dizer. Ela me mostrou no canto do quarto  um” pinico branquinho”.  Sem opção aceitei a oferta e elegantemente, fiz o meu xixi amigo que já me estourava a bexiga.  Nova dificuldade surgiu no momento :  o que fazer com o pinico ?  Ela, gentilmente me disse que não me preocupasse com isso que ela resolveria. Foi muito constrangedor ter que fazer xixi no pinico !!!
                      Voltei para o ônibus que logo seguiu viagem e durante o resto do percurso me mantive quieta e pensativa. Tinha acabado ali o meu sonho de um “amor e uma casinha “!      Não sei muito bem o que aconteceu comigo. Acho que naquele momento eu percebi que as pessoas querem mais da vida e por isso fazem outros sacrifícios para  atingir os seus objetivos.  Acho que entendi  o esforço de nossos pais para que estudássemos.  Não me senti decepcionada com o que constatei, apenas percebi que a gente dá muito valor a conforto e outras coisas, que aquelas pessoas que tem a sua vida mais simples  não valorizam talvez.  Tenho absoluta certeza de que quem ali vive é feliz. Percebemos isso pela forma como se tratam e como tratam do seu precioso bem. A casinha que eu visitei, era de uma limpeza impecável, tinha um cheiro bom de comida sendo feita e as pessoas eram gentis, educadas e tranqüilas.
                     Talvez  aquela visita, tenha acabado com o meu sonho de menina, mas não tirou de dentro de mim o encanto de saber que a felicidade pode estar em todos nós, independente de ter ou não. Esse pensamento me acompanhou pela vida toda e em alguns momentos eu quis  ter uma casinha no morro e ser  FELIZ !!!

Graça,março/2012

2 comentários:

  1. Que história linda e leve! Bjs. Mary

    ResponderExcluir
  2. È MUITAS VEZES ACREDITAMOS QUE A FELICIDADE ESTÁ NO QUE NÃO TEMOS,E MUITAS VEZES SOMOS FELIZES,E NÃO SABEMOS,MUITO TEMPO DEPOIS QUE VC PERCEBE ISSO.

    ResponderExcluir